21.3.07

Filme

Olhava pela janela do quarto e já sentia saudades daquela paisagem tão familiar. Não esqueceria as árvores, o céu azul, o canto do bem-te-vi, o barulho do mar, o cheiro de maresia. Onde encontraria de novo o colorido do jardim? Onde o vento sopraria com tanta suavidade? Onde o sol aqueceria seu corpo?
Suas forças já se esvaíam. Chegara a hora de ir embora. Não queria mais ficar. As dores estavam insuportáveis e sabia que o fim, qualquer que fosse ele, aliviaria o sofrimento. Entregou-se. Fechou os olhos, respirou e partiu.
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Descobriu-se numa grande sala. De repente, à sua frente, uma enorme tela de cinema. Sem conseguir compreender o que estava acontecendo, viu sua vida começar a ser projetada, com direito a sons, imagens, cheiros, sabores e sensações. Tudo se repetindo, só que muito rápido. Percebeu como deixou de aproveitar momentos preciosos, como se descabelou por tão pouco. Viu-se pequena, encantando-se com o mundo que descobria. Ouviu seus sonhos da juventude. Experimentou o cheiro de café vindo da cozinha e sentiu o gosto da sopa de feijão preparada para seus filhos. Reviu todas as pessoas que foram importantes em sua vida. Família, amigos, amores. Também viu quanto os magoou com palavras duras. Passeou pela casa da infância, tomou banho de cachoeira, mergulhou no fundo do mar. Aos poucos foi compreendendo como endurecera, como deixara que as dificuldades tirassem o brilho que tinha nos olhos. Como fora boba. Olhando-se assim, de fora, sentiu uma enorme compaixão pela mulher que fora. Prometeu para ela que numa próxima oportunidade não repetiria os mesmos erros e, principalmente, não teria medo da vida.