19.2.09















FOTOS: ROBERTO ARRAIS
Desde que me propus a abraçar a vida de escritora, percebi que observo muito mais os detalhes simples do cotidiano e me peguei sentindo poesia nas pequenas coisas.
Encanto-me com o brilho do mar na hora que o sol começa a cobri-lo com sua luz (qual a cor do mar neste instante?), deslumbro-me com a melodia das palhas do coqueiro que dançam ao som do vento, fico em êxtase com o canto dos pássaros e com a coreografia das lavadeiras no chão cheio de desenhos da areia da praia. Adoro beber água do mar; é tão salgadinha. Mergulho devagar, deixando apenas os olhos de fora e contemplo o horizonte. É só mar e céu azul, com a linha que marca o encontro dos dois ao longe. Não há mais nada, apenas a Perfeição. Do coqueiro, no jardim, caem os coquinhos que formam um tapete no chão gramado. Fica lindo o colorido do verde com o marrom. Há, também, as cores das flores, o cheiro do manjericão, o perfume do jasmim e a delícia das jabuticabas.
Fico, com meu marido, a aguar nosso jardim, contemplando o vai e vem das ondas do mar. O som das ondas é outro que me coloca em transe. Tudo é impermanência. Este movimento se reproduz no balanço das redes no terraço, onde nos largamos em momentos de leitura.
Comemos e lavamos os pratos olhando o mar. Vemos os pescadores com seus barcos e suas redes, vemos as mulheres catando mariscos, vemos as crianças construindo castelos de areia. O nosso lar não é de areia e é um pedacinho do nosso Paraíso. Lá reabastecemos nossas energias. Ao sentir tão de perto a energia da natureza, confirmo que tudo está interligado e me maravilho com as manifestações do Sagrado na Terra. Só a agradecer.

18.2.09

Fiquei pensando, noutro dia, que há pessoas que participam da vida e outras que apenas a assistem. Lembrei-me da imagem que registrei quando fui assistir ao show de Maria Betânia numa grande casa de espetáculo. O palco todo iluminado, público enorme, vigilância redobrada contra os possíveis ataques de fãs à artista. Observei alguns homens, todos fortes, vestidos de terno preto, de costas para o palco, verificando o movimento da massa. Enquanto isso acontecia, a cantora emprestava sua voz às poesias que entoava.
Os ingressos estavam esgotados dias antes do show. Aqueles homens tinham o privilégio de estarem a poucos metros da artista e, no entanto, não assistiam, de verdade, à sua apresentação. Não suspiravam a cada canção de amor, não viajam pelos lugares que Betânia descrevia em suas melodias. Às vezes, as pessoas ficam assim frente à vida: tão perto e tão distante.
Quando é que se começa a ser espectador e não autor da vida? Certa vez, em viagem pelo interior, vi uma menininha comprar um pirulito numa venda e, assim que o abriu, o pirulito foi ao chão. A menina olhou para ele com uma tristeza profunda, percebeu que eu presenciara a cena e comentou: “Não tem problema, não”. Fiquei indignada com sua posição. Ajoelhei-me ao seu lado e comecei a conversar, tentando colocá-la em contato com os seus sentimentos.
Por que não lutar pelo que queremos? Por que desistir de nossos sonhos? Por que não viver a vida desejada, em segredo, em nossos corações? Por que não sermos autores de nossas próprias histórias?