23.5.07

Comadres

Freud tinha razão quando disse que não saberia precisar o que quer a mulher. Não existe A mulher; existem mulheres que desejam coisas diferentes.
Não consigo enxergar uma massa de mulheres, todas iguais. Às vezes tenho a impressão de que estou à frente de uma tuia delas. Operárias de fábricas com a mesma farda, mães em reunião de escola, executivas fantasiadas de terninho, donas de casa trocando receitas e tantas outras situações que são apenas simulacros da essência feminina. No caso das operárias de fardas cinzas, com o olhar mais detalhado haverá a revelação de um batom, um brinco, um rabo de cavalo, algo que faça cada uma delas existir na sua singularidade.
Poderá uma mulher ser capturada em sua totalidade? Ou haverá sempre o mistério? Entre amigas, ao redor do fogo da cozinha ou de uma mesa de bar, um pouco dos seus segredos podem ser revelados. São momentos mágicos em que as mulheres compartilham sua divindade.
Lembro-me agora de um encontro de amigas numa fazenda. Estavam lá com suas famílias para um final de semana. Maridos no terraço tomavam cervejinha; filhos corriam pelo quintal. E elas na cozinha, jogavam conversa fora. Uma falava como a outra era dormente de tão demente que era; outra contava que seu filhinho de nove anos estava de namoradinha, uma verdadeira serial killer; a baixinha dizia que nunca iria querer ser uma Pepsi, pois as pessoas sempre diziam ‘me passa a Coca aí’ e ela queria era ser chamada pelo seu nome de verdade; a bem bonita e enérgica era a Pinho Sol, tinha mania de limpeza. O filho de uma delas estava febril; a mãe na maior calma; a amiga disse logo que se fosse o seu, ela UHH-UHH- UHH, imitando o barulho se uma sirene. E assim, entre risos e lágrimas, compartilhavam sua intimidade. Claro que também falavam dos maridos, dos seus e dos das amigas ausentes. Um deles, coitado, era tão destrambelhado que colocou o computador quente no freezer. Pode? E aquele outro fulano que estava botando a maior gaia na mulher com uma amiga de infância. Ingênuo, deixou às vistas uma foto dele de cabelo molhado, com um fundo típico de motel. A mulher saiu pelos motéis da cidade, acompanhada pela comadre, achou o tal da foto e registrou-se no mesmo lugar, levando a imagem para ele. Pense no susto. Ele até hoje não sabe se a gaia também foi retribuída. Quando se fala em motel, as histórias brotam. A amiga de uma delas organizou a festa de 15 anos de casada no motel; foi antes, com outra comadre, levou velas, incensos, cremes, pétalas de rosas, champanhe; combinou com o marido que ligaria à noite para avisá-lo sobre o local da comemoração; quando a amiga foi deixá-la no motel à noite, houve o maior engarrafamento porque um dos apartamentos estava em chamas; o romantismo cedeu lugar ao desespero e ainda ficaram ouvindo gracinhas na enorme fila de carros sobre as opções homossexuais das duas. Só sendo mulher para passar por isso. E acompanhada por uma outra mulher,claro.

20.5.07

Amigas

Sabe quando você vive um dia mágico? Pois foi assim comigo ontem. Tenho uma amiga muito especial que me ligou e me chamou para um passeio pela Jaqueira. Topei na hora. Coloquei a roupinha básica de ginástica e dez reais enrolados na calcinha.
Ela chegou, desci toda faceira e ao entrar no carro ela me fez o convite “Topas ir para Aldeia? Preciso comprar uns bambus.”. Claro que concordei e fomos ladeira acima curtindo a paisagem, o clima e, principalmente, o papo. Aprendo tanto com ela. Escolhemos o bambu e bastou ela pôr as mãos na direção do carro e já surgiu outro convite “E se a gente fosse almoçar em Gravatá?”. Mais uma vez, pegamos a estrada. Convidamos outra amiga para a aventura. Ela estava fazendo as unhas e colocou bacias e esmaltes de lado para se juntar a nós. Parecíamos três jovens adolescentes com enorme sede de vida. O verde, as montanhas, o friozinho e as conversas ininterruptas marcaram a subida da serra. Tudo sem pressa. À medida que subíamos deixávamos para trás todos os outros papéis que desempenhamos, o de mãe, o de esposa, o de filha, o de profissional, o de dona de casa, o de avó; carregávamos apenas nós mesmas. Visitamos condomínios, passeamos e fomos almoçar numa charmosa cantina italiana. Boa comida, bom vinho, boa subremesa, boa conversa. Não aquelas conversas superficiais de mesa de bar ou de restaurante. Muita, muita intimidade. Estávamos ali compartilhando nossas almas. Um privilégio. Depois a volta, com olhos brilhando, coração leve e completamente reabastecidas. Um presente. Das Deusas, é claro.