8.5.10

Estava conversando com meus filhos sobre como fico encantada com a natureza, onde tudo está inteligado e o Universo apresenta uma lógica perfeita. Comentei que adoro saber que o mesmo ar que respiro chega até as estrelas e o que quer que elas façam também chega até aqui. Não sei se há verdade nisso, mas gosto de acreditar que é assim. Apesar de já ter quase cinquenta anos, ainda vejo o mundo com os olhos de uma criança. Sinto a presença da fadas, duendes e só conheci bruxas boas.
Epa! Agora conheci uma pessoa muito, muito, muito má. Não sabia que existia gente assim. Há algum tempo sinto sua presença em meu campo energético, pois percebo um mal estar e algumas dores numa área consagrada ao feminino. Queria saber mais sobre ela e, por isso, transformei-me numa mosca e a acompanhei numa visita a um lugar onde se trabalha com leis. Pude ver sua alma e quase desmaiei de susto quando vi sua verdadeira face, escondida sob a máscara que usa em suas relações sociais.
É feia, muito feia. Seu rosto é quase uma caveira, tem olheiras profundas e seu corpo começa a entrar em decomposição. Aliou-se a magos negros, com o intuito de destruir pessoas e conseguir vantagens em seus negócios escusos. A conta vai começar a ser cobrada. Não se tem como fazer um pacto com o diabo e não se arcar com as consequências depois. Ela se acha tão esperta que pensou que iria enrolar o próprio demo. Ledo engano. Uma grave doença não tarda a aparecer e aí, sim, talvez possa aprender um pouco sobre o amor e sobre a vida.
Não a conhecia pessoalmente, só ouvira falar dela e, confesso, que o que escutara não me animava para um encontro. Todos e todas, sem exceção, diziam que ela era uma pessoa horrorosa, que era capaz de tudo. Tive a oportunidade de conhecer seus colegas de trabalho, seu marido à epoca, sua filha, seus colegas de faculdade. Em nenhum deles deixou uma marca de admiração. Só a queriam bem longe de suas vidas.
Mesmo metamorfoseada de mosca, eu ainda tinha a mente da bruxa que trabalha com a Deusa e pude sentir o quanto seu feminino é ferido. Até que tem um rosto bonito, olhos claros, cabelos pintados, provavelmente para esconder os fios brancos de uma mulher quase sexagenária, um corpo magro. Vestia um casaco preto que representava, para mim, toda sua dor de ser mulher. Compreendi o porquê de seu comportamento rancoroso, destruidor em relação aos homens, competitivo em relação às mulheres. Vive alardeando uma moral que não pratica. Provavelmente não teve um colo amoroso e morre de inveja de quem recebeu carinho da vida. Lembrei-me de uma fábula em que uma mulher expele lagartos, sapos e cobras todas as vezes que abre a boca. Ela é exatamente assim. Deve ser muito doloroso ser desse jeito. Mas esconde o quanto é frágil num terrível jogo de manipulação e domínio. Como é inteligente, sabe que as pessoas que ainda estão ao seu lado não enxergam quem é verdadeiramente, pois não sabem de seus podres, visto que diz que luta em prol de todos, da família e dos filhos. Lá dentro de seu coração, fiz um scanner em seu campo energético e não encontrei este órgão no seu corpo vital, sabe que não é nada daquilo que aparenta. O que aconteceria se soubessem que já praticou abortos, que já foi meretriz, que é ladra? Como poderia transitar na alta sociedade?
Porém, tem uma coisa mais triste ainda: ela percebe que as pessoas cedem às suas exigências para se verem livres de sua presença em suas vidas. Até consegue vitórias no campo material, mas, com certeza, com um terrível gosto amargo na boca. Deve ser muito doloroso se encarar a mais absoluta solidão.
Depois que vi e compreendi tudo isso, deixei de ser mosca e virei bruxa de novo. Fiquei feliz em descobrir que a vida tinha me presenteado com uma existência sem pessoas assim ao meu lado. Estava em minha cama, cercada de coisas maravilhosas. Entre elas, a camisa que meu marido havia usado no trabalho o dia todo. Peguei-a em minha mãos, cherei-a, mais uma vez, mais uma vez, puxando com força o ar para que seu cheiro de homem se entrenhasse em meu corpo. Sorri tranquila. Amo e sou amada por um homem maravilhoso, com uma alma linda, com um corpo delicioso, cujos beijos me fazem sentir que o paraíso é aqui e agora.
Adorei não ser aquela, mas ser esta, que tem vestido branco, fluorescente, todo pintado com palavras, frases e poemas, para, através da escrita, comunicar ao mundo os segredos que guarda no coração, sem medo de se mostrar e de viver feliz.

5.5.10

Li que há 16 anos não temos um jogo assim: Sport e Náutico, numa final do pernambucano.
Fiquei pensando em como estava minha vida 16 anos atrás. Já tinha meus três filhos. O caçula acabara de nascer, o mais velho estava com um ano e a mocinha tinha aprendido a ler. Meus pais eram vivos e estavam saudáveis. Eu era casada e ainda estudava Psicologia. Trabalhava na UFPE com computadores. Também tinha, como companheiras de jornada, minha tia, minha babá, a babá de meu pai. Não imaginaria, por mais criativa que fosse, os caminhos que a vida traria para o meu dia-a-dia.
Neste período muitas e muitas e muitas coisas aconteceram, levando-me para longe de pessoas que amo, ou pela morte ou por situações que me fariam arrancar de volta o dinheiro da cartomante que fizesse essas previsões para meu futuro.
Os computadores se assemelham a dinossauros para mim. A Psicologia da faculdade está distante de ser a que acredito como possibilidade de encontros para a alma ferida. Estou mais para bruxa que para psi. E, no meu presente, o meu presente seria me tornar uma verdadeira escritora. Já participei de coletâneas, já lancei livro infantil, tenho blog, mas falta assumir a vocação e vivenciá-la com a disciplina e a solidão necessárias.
Meu pai teve um avc e hoje seus olhos já não têm o mesmo brilho. Transportei no carro os ossos do que fora o corpo amado de minha mãe. Perdi muito, perdi muitos.
E tive alegrias, como as tive. Conheci pessoas, acolhi clientes, aprendi que ser gente é um dos presentes que aquele lá de cima nos dá, junto com um monte de formas de vida fantásticas e que estão por aí, de bobeira, para compartilhar a existência com aqueles que percebem sua presença.
Cantei canções de ninar, dei banho, acompanhei as aulas de natação, contei histórias, mergulhei no fundo do mar, viajei de trem pela Sibéria, meditei, dancei, fiz amor, li, escrevi, sonhei... realizei.
Escutei meu coração e fui atrás dos meus desejos. Meu príncipe virou um sapo, encontrei meu rei.
Ando mais sabida agora. O tempo foi um grande amigo. Ensinou-me coisas importantes. Aprecio a natureza, respiro, estou menos agitada, tenho aprendido com minha filha a ter uma alimentação mais saudável, aprendo com meus filhos músicas novas, aprendi com meu marido que minha alienação tem perdão. Ouço as palhas do coqueiro e as ondas do mar. Sinto a paz.
Sei que o amor é o que ilumina o caminho do coração. Procuro senti-lo quando tenho escolhas a fazer. Só peço a Deus que eu continue acreditando em fadas, duendes, gnomos e Papai Noel. Ainda não os vejo, mas os sinto entre as flores de meu jardim bem pertinho do mar.

3.5.10

Estava irritada. Fazia um tempão que aguardava minha vez no consultório de meu ginecologista. Médico particular, pago com um convênio caríssimo, mas que não oferece o privilégio do cumprimento do horário. Muitas outras estavam na mesma situação. De repente, entra na sala a atual do meu ex. Como já nos conhecíamos antes do momento em que estamos numa situação engraçada quanto ao mesmo homem, sentou ao meu lado e começamos a conversar. Banalidades. Reclamamos do nosso ginecologista pela demora em nos atender. Papo de mulher.
Então, o trivial foi sumindo e ela começou a me perguntar o que tinha acontecido no meu relacionamento para que eu e meu ex, atual dela, terminássemos o casamento. Juro que a compreendi. Quis até ajudá-la. Mas, emudeci. Entre ser fiel a ela e ao meu ex, escolhi-o. Não conseguiria falar mal dele para ela. Protegi-o. Como revelaria todas as minhas queixas, todos os atos que o foram diminuindo perante meu olhar? Falo disso para ele, para minhas amigas íntimas, para o meu atual marido, para que não repita os mesmos erros, acho eu. Não falo mal dele para nossos filhos, para amigos em comum. Vivemos juntos vinte anos, fizemos amor durante todo este tempo, tivemos inúmeros momentos mágicos. Agora, para mim, escondeu sua luz e só revela suas sombras. Direito dele. Mas acredito que isto também é providência divina, porque quando o sinto assim, dou graças aos céus de ser meu ex e tudo fica mais fácil. Não falaria para sua atual esposa sobre as sacanagens na divisão dos bens, sobre quanto é falsa a história que ela conhece como verdadeira. Talvez, um dia descubra, talvez, não. Pouco importa. A história dos dois é dos dois e meu ex tem o direito de fazer diferente agora e ser feliz. Eu é que não vou estragar a festa.