27.3.07

O Feminino vive aqui.

Há algum tempo trabalhamos com grupos de mulheres e também aprendemos com nosso próprio caminhar sobre a construção do feminino. Nascemos fêmeas, mas nos tornamos mulheres a partir das interações com nossos grupos culturais. E podemos garantir que as fêmeas do ocidente neste início do século XXI estão feridas.
No princípio dos tempos, as mulheres estavam em contato com sua natureza, viviam de acordo com seus ciclos e eram respeitadas na comunidade, pois sangravam, geravam novas vidas e nutriam os filhos. A natureza fornecia as metáforas para significação do papel das mulheres: geravam e nutriam, tal qual a Mãe Terra; sangravam de tempos em tempos, da mesma forma que a Lua. Também guardavam a memória de seu povo e transmitiam sabedoria através das histórias contadas ao redor das fogueiras.
Com a caça, a criação de animais em cativeiro, as guerras, os machos puderem contribuir mais para a sobrevivência dos grupos e colocaram as fêmeas no lugar de ‘receptoras’ da vida que era gerada por eles. As mulheres, desvalorizadas, voltaram-se para a escuridão, assim como toda a sociedade.
De deusas a escravas. Esta foi a trajetória que as mulheres realizaram e na qual viveram durante muito tempo. Nos anos 1960, depois que o mundo precisou de sua mão-de-obra devido às guerras, as mulheres fizeram-se ouvir novamente: queimaram sutiãs, tomaram pílulas, disseram sim ao sexo livre, foram para o mercado de trabalho, conquistaram os direitos que só os homens tinham.
Para transitar no mundo masculino, as mulheres saíram de casa, vestiram terninhos, investiram com toda força na formação profissional e conquistaram o sucesso. Para isso, desconectaram-se de sua natureza primitiva, pois não poderiam disputar em pé de igualdade os espaços de trabalho com os homens se fossem respeitar o ciclo menstrual – as variações hormonais são enormes - e a necessidade de cuidar e alimentar as crias – como toda fêmea, têm os sentidos aguçados na fase que precisam cuidar dos bebês. Para não se sentirem inferiores aos homens, assumiram a forma masculina de ver o mundo, traíram sua essência e renunciaram à energia feminina. Pagaram um preço alto, muito alto.
Os homens ficaram assustados com as transformações. Exigiram que além do sucesso na vida pública, assumissem as tarefas da vida familiar e, assim, as mulheres tiveram que dar conta do trabalho, da casa, dos filhos, do marido. Claro que não conseguiram segurar a onda e surgiu a sensação de fracasso. Mulheres que investiram na vida profissional, sentiram-se fracassadas no lar. Mulheres que ficaram em casa, sentiram-se envergonhadas por não terem um diploma, um emprego, um salário. Todas se sentiram inadequadas.
Surgiram anúncios de absorventes que dissimulavam a menstruação, de celulares que permitiam uma conexão integral com os filhos em casa, de escolas que possuíam câmeras para que mães acompanhassem o dia a dia dos filhos. Surgiram o microondas, o fast food, o instantâneo.
Passamos a viver no mundo do artificial. Fugimos do natural. Vivemos mais felizes? Pesquisas indicam que crianças que ficam mais tempo longe das mães se tornam adultos mais violentos. Os consultórios de Psicologia estão abarrotados de crianças que se identificam com motoristas e babás, pois os pais estão ausentes, numa luta incessante para conquistas de novos bens materiais. Governos ampliam o período da licença maternidade para garantir uma vida mais saudável para seus membros, tanto psíquica quanto emocionalmente, na tentativa de diminuição dos custos com a saúde pública.
Percebemos que tomamos o caminho errado. Destruímos o planeta e a natureza nos ensinou que não somos superiores a outras formas de vida que compartilham conosco a Terra. Estamos, sim, todos interligados: árvores, rios, animais, rochas e seres humanos. O mito dos deuses humanos ruiu. É preciso que nos reconectemos com a natureza, que escutemos seus sinais. Não podemos experienciar um novo tsunami, onde só animais –os elefantes, por exemplo – percebem a eminência da catástrofe; precisamos reaprender a ler o mundo.
Acreditamos que um novo tempo já está sendo construído e o feminino renascerá em cada mulher, em cada homem, levando-nos de volta para casa, para a natureza. Como no princípio dos tempos, teremos como guias neste novo caminhar, as fêmeas reverenciando, sem vergonha e sem culpa, o Sagrado Feminino. As mulheres não mais imitarão os homens. Ensinarão com alegria que todo o Universo pulsa sempre no ritmo da vida. O feminino renascerá aqui.

“Viver é pulsar. É ser canal para que a Energia Cósmica faça – através de nós – o seu trabalho no mundo”. Sandra Celano

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