28.4.08

Outra versão dessa metáfora do jumento é a febre dos concursos públicos. Investimos dinheiro e tempo em cursos preparatórios para concursos públicos na tentativa de garantirmos um bom emprego para o resto da vida. O que seria um bom emprego? O que seria uma vida boa? Todos os dias o mesmo trajeto, o mesmo cartão de ponto, o mesmo birô, a mesma rotina, o mesmo ritual de olhar o relógio esperando que toque o sino da liberdade? Não importa que a semana seja terrível, temos os fins de semana, temos as férias para fazermos o que realmente nos dá prazer. Essa repetição nos traz a sensação de segurança: não podemos ser jogados fora, pois há estabilidade no emprego; não precisamos dar nosso sangue, pois não estamos no mercado selvagem da competição das empresas privadas. O desconhecido nos assusta. Atrás do imprevisível está a certeza da morte. E tentamos fugir dela, como tentamos. A ilusão de que controlamos a vida, o cotidiano, faz-nos sentir com poderes para ludibriar a morte, o fim de tudo. Assim, voltados para o que está fora, fugimos de nós, fugimos da vida. E perdemos tanto por ficarmos enforcados com a corda do jumento. Como nos ensina Lenine, ‘ninguém faz idéia do que vem lá, do que vem lá’.

Nenhum comentário: