7.3.12

Eu era uma menina quadrada. Vivia num mundo quadrado. Morava num apartamento, ia para lá e para cá num carro, passava muito tempo numa sala de aula de uma escola, via televisão, tinha uma mala quadrada. Para piorar as coisas, usava óculos quadrados.


De tanto ficar em quadrados, terminei ficando cabeça quadrada e, assim, pensando que o viver também era quadrado. Tudo certinho: quatro lados iguais, quatro ângulos iguais. E fui fazendo tudo o que os certinhos fazem: estudava, tirava dez – diziam que seria cientista -, era bem comportada, não reclamava, não pensava, não sentia. Acho que imitava e seguia sendo uma maria-vai-com-as-outras.

O tempo passou, cresci quadrada, fui trabalhar com uma coisa quadrada, o computador. Tudo exato, tudo certinho. E eu cada vez mais quadrada, cercada por coisas quadradas.

Mas aí aconteceu uma coisa na minha vida que fez com que meu corpo deixasse de ser quadrado: fiquei grávida e minha barriga foi ficando cada vez mais redonda, virou uma bola e eu me tornei um círculo.

Nem percebi direito como aconteceu, mas eu era mãe, tinha filhos, e essa coisa mágica, de ver a vida brotar, fazia com que eu não coubesse mais numa vida quadrada.

Deixei o trabalho com o computador-quadrado, desliguei a TV-quadrada, abandonei o carro-quadrado, me mudei do apartamento-quadrado

O que fiz?

Fui morar numa casa com jardim, cercada de plantas, pedras e animais. Comprei uma bicicleta com cestinha. Li livros, muitos livros, tantos livros que resolvi trabalhar fazendo livros.

Como consegui?

Simples. Tirei os óculos quadrados e comecei a enxergar com o coração, que de quadrado não tem é nada. No lugar de cientista, virei foi artista.

Um comentário:

Aline disse...

que coisa linda!