11.1.10






Certa vez, fui varrer minha casa e tive calo nas mãos. Fiquei envergonhada por ter uma pele tão sensível, pois isso significava que não estava acostumada às labutas da vida cotidiana. Em outro momento, fui cuidar do jardim, podando flores e arbustos, e novo calo nas mãos. Hoje, fui fazer feira sozinha, meu anjo da guarda está de férias, e mais mãos feridas porque a pele é muito fina. Meus dedos estão acostumados à textura das folhas dos livros, à tensão da caneta no papel, ao teclado do computador. Na infância, minha mãe contava a história de uma princesa que dormira sobre dez colchões de plumas de ganso e havia acordado com o corpo dolorido porque embaixo dos colchões havia uma pequena ervilha; isto provava sua nobreza. Estou pior que a princesa da imaginação dos meus tempos de criança.
Todas as tarefas para que minha sobrevivência flua tranquila são realizadas por outras pessoas. E tenho quase cinquenta anos. Que absurdo! Não lavo e não passo minhas roupas, não limpo minha casa, não cozinho a comida que é servida à mesa de minha família. Anos e anos dedicados apenas ao trabalho intelectual. Alienada, sem consciência da luta de classes. Quase nada do tempo que já passei foi vivido com atividades que usassem as mãos. Também não sei bordar, costurar, desenvolver qualquer atividade de artesanato. Nem sei que ervas curam o quê. Preciso de uma infraestrtura imensa para sobreviver.
Lembro-me agora da enorme quantidade de diplomas e certificados que tenho e que comprovam que sou uma pessoa de muitos conhecimentos. Lembro-me dos professores de mestrado e doutorado que tive e como muitos deles sabem muito de muito pouco, são especialistas, e muito pouco sobre a vida. Lembro-me das pessoas sem estudo que já encontrei e como eram sábias. Às vezes, os doutores das letras até as vêem com uma superioridade completamente equivocada. A sabedoria está na vida e citando uma história que ouvi ‘pois é, doutor, cada um com suas ignoranças’.
Se é verdade que 2012 está chegando com o apocalipse nele, estarei completamente despreparada para a nova forma de sociedade que irá surgir. Tomara que haja tempo para que eu me resgate e me conecte cada vez mais com o ritmo da vida e com as tarefas que os seres humanos desenvolvem desde que o mundo é mundo. Chega do virtual. Que venha a realidade!

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