19.4.11

"Fogo que arde e não se vê".

Fico pensando em quantas coisas o coração da gente sente e não diz. Não diz porque não pode, porque as pessoas com as quais convivemos iriam ficar chateadas, porque o que desejamos dizer pode nos colocar numa situação delicada. E, assim, passamos a vida guardando segredos num coração que vai ficando fraquinho, fraquinho, porque não pode viver plenamente.

A grande maioria do que não pode ser revelado se refere a sentimentos amorosos. É um ‘eu te amo’ que fica guardado no peito, é um ‘que saudades eu sinto de você’ que fica trancafiado, é um ‘volta para mim e vamos começar tudo de novo’. Muita gente espera a morte chegar para se mostrar inteiro na transparência da alma numa outra dimensão. Lá, no horizonte, não se consegue esconder os segredos do coração. Acredito assim.
Então, fiquei matutando com meu coração e meus botões, se a minha passagem se fizesse hoje, o que seria revelado que meu coração guarda a sete chaves? Sei que ele falaria do enorme amor que guardo por meu primeiro namorado. Como gostaria de encontrá-lo, numa esquina da vida qualquer, e conversar sobre como foram nossas vidas. Será que não ficamos juntos por medo, por covardia, pois o que sentíamos um pelo outro era grande demais para o corpo dar conta? Será que nossas almas irão ficar juntas no novo endereço? Outro sentimento que cultivo com carinho em meu coração é o amor pelo meu primeiro marido, o homem por quem perdi a cabeça, cujo corpo fazia o meu arder em quarenta graus, com quem tive minha primeira filha, também com quem construi os mais belos castelos do meu conto de fadas. Sonhei que seria feliz para sempre ao seu lado. Esqueci que pra sempre, sempre acaba... O que revelaria o meu coração sobre os meus sentimentos em relação ao meu segundo marido? Haveria mágoa, dor, abandono, mas sei que muita gratidão por um dia-a-dia repleto de cenas de margarina de uma família feliz. Ao seu lado pude resgatar meu feminino e com ele tive dois filhos lindos. Sem as máscaras que uso do lado de cá, ele poderia ver o quanto lhe quero bem.
Há o que meu coração gostaria de falar para meu companheiro atual e que muitas vezes faz silêncio por respeito à sua alma grande, com muitas dificuldades de lidar com o ego. Vou deixar que este pedaço do coração tenha voz na outra dimensão.
Estava deitada na cama, vendo o dia começar e a chuva tomar conta de tudo, e pensei que eles fizeram parte de minha vida, viveram comigo a minha história e que nos textos que escrevo e que são pedaços de mim, escondo-os em pronomes – ele, dele, seu, meu, nosso – sem citar seus nomes. Li num livro, outro dia, que um marido de escritora não pode desejar privacidade e anonimato. E ex amores podem?
Quando a gente dá um beijo na boca, tem a boca de um, a boca da outra pessoa, e como é que se pode contar do beijo sem falar do outro? Não se beija sozinha. Então, como falar dos amores que tive, sem falar dos homens que amei?!
Ando saudosista, viajando pelo passado, com saudades das que fui e do que já vivi. É tão bom lembrar momentos felizes. Resolvi que vou contar a minha versão dessas histórias. Eles que contem as deles.
Hoje vi e ouvi Vinicius de Moraes. Mexe com nossa capacidade de amar. Poetinha sabido, este!
“A vida só se dá pra quem se deu”.

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